A Volta do Herói Improvável
Trazendo para a realidade o mítico neo-noir de John Wick, com quem compartilha o roteirista Derek Kolstad, o primeiro ‘Anônimo’ se revelou uma comédia de ação surpreendentemente potente. Foi mais uma prova do trabalho de qualidade da produtora 87thNorth, responsável por introduzir no cinema de ação americano uma valorização do trabalho de dublês e da ação puramente física, algo mais comum em outras cinematografias. Seu protagonista, o antes comediante Bob Odenkirk (conhecido por “Breaking Bad” e “Better Call Saul”), aproveitou a oportunidade para adicionar mais um registro impressionante à sua vasta gama de talentos em um filme perfeitamente concebido.
Nova Direção e um Cenário Inusitado
Em ‘Anônimo 2’, há uma troca de diretores: sai o russo Ilya Naishuller e entra o indonésio Timo Tjahjanto. A mudança mantém a proposta de aplicar um olhar estrangeiro e energético a um filme que começa sugerindo uma crise matrimonial, mas que rapidamente se transforma em um faroeste ambientado em um cenário que representa um passado idealizado dos Estados Unidos: um parque de diversões, que aqui funciona como uma encarnação decadente do clássico assentamento no deserto.
O Conflito Central: Família vs. Violência
Quatro anos após seu confronto involuntário com a máfia russa, Hutch Mansell (Odenkirk) ainda carrega uma dívida de 30 milhões de dólares com a organização, que ele tenta pagar aos poucos através de uma série interminável de golpes contra criminosos internacionais. Odenkirk novamente brinca com sua aparência de homem comum para se transformar em uma espécie de Buster Keaton do gênero de ação, transportando para a tela a frustração de um pai de família assombrado pelas memórias distorcidas de sua infância.
No entanto, Odenkirk reitera que, além da ação, o tema central de ‘Anônimo 2’ é a resolução de conflitos familiares, algo que conecta o público de uma forma mais profunda do que o mero espetáculo de recursos e cenas de luta. “No primeiro filme, a casa dele foi assaltada, e essa frustração e raiva o levaram a sair para o mundo. Então, Deus lhe enviou uns caras maus para que ele pudesse espancá-los e deixá-los em pedaços”, explica o ator. “Hutch tem filhos pequenos em casa, que estão crescendo e chegando ao ponto de sair de casa em breve. Para mim, a família também é o mais importante; meus filhos já cresceram e saíram, não precisam mais de mim”, reconhece.
Esse sentimento é compartilhado por sua colega de elenco, Connie Nielsen, que interpreta Becca, a matriarca da família que, em um momento crucial, não hesita em pegar uma espingarda para enfrentar uma ameaça. “O problema central é ter um marido que é um homem violento, mas que, ao mesmo tempo, quer ser um bom pai”, reflete a atriz.
Muita Ação com Orçamento Modesto
Cenas como a de Hutch Mansell (Bob Odenkirk) prestes a morrer nas mãos de Lendina (Sharon Stone), apenas para ser salvo por sua esposa Becca (Connie Nielsen) com um tiro de espingarda, seguidas pela explosão de uma feira, foram realizadas com um orçamento de apenas 25 milhões de dólares. Em ‘Anônimo 2’, não houve desperdício de balas, explosivos ou o uso de guindastes gigantescos como os de Tom Cruise em “Missão: Impossível”, nem a criação de monstros sofisticados como em “Jurassic World: Dominion”, cujos orçamentos variam de 180 a 200 milhões de dólares. Com um orçamento mais modesto, que geralmente não ultrapassa os 45 milhões, heróis como Hutch conseguem se destacar. As cenas de ação são reservadas para momentos estratégicos, enquanto as histórias focam mais nas relações familiares e perdas pessoais.
Pontos Fortes e Fracos da Sequência
O filme sente um pouco o fator de repetição em relação ao memorável primeiro longa, mas é algo sutil. A transposição de um duelo de faroeste para um cenário de férias totalmente kitsch logo assume o controle da narrativa ágil de Tjahjanto, que aplica um estilo visual distinto do primeiro filme, mas, ao mesmo tempo, complementar. A verdadeira falha de ‘Anônimo 2’ talvez esteja na transição apressada do segundo para o terceiro ato, onde o filme perde um pouco o ritmo de algumas interações familiares. Dito de outra forma, os personagens secundários são pouco explorados: as participações previsíveis de RZA e Christopher Lloyd têm pouco impacto, assim como a resolução de suas tramas.
Veredito Final
É um defeito, no entanto, facilmente perdoável graças ao estilo de seu diretor, que brilha não apenas nas cenas de ação. ‘Anônimo 2’, um filme sobre a falsidade das memórias idealizadas e sobre a ambivalência da família — que pode ser tanto uma prisão quanto uma libertação —, se destaca por ser um dos poucos títulos americanos do gênero que permite ao espectador “respirar”, criando espaço não só em suas cenas de ação, mas, sobretudo, em cada conversa casual. Embora um pouco inferior ao original, a sequência ainda é um ótimo filme.
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